domingo, 11 de agosto de 2013

O Sal e a Páprica



“O sucesso do  sofisticado prato que preparar, dependerá mais da quantidade adequada do reles sal do que qualquer ingrediente mais excêntrico e raro”



E esse tempo que não passa... O quê esse médico e
stá fazendo lá dentro, uma cirurgia? Veja só essa “fauna”. Homens taciturnos sentados em silêncio, folheando essas revistas que não podem interessar a ninguém. Eu não devia estar aqui. Ou devia? Será que minha estória é tão diferente da deles? Sou um homem pacato. De família. Seriam eles?

Seria eu?

Bem, se vim parar aqui, é por que minha jornada também não me credencia muito a julgar ninguém. Minha esposa é linda e carinhosa. Um amor verdadeiro, garimpado com afinco nas minas do tempo. Meu porto seguro. Minha alma gêmea. Minha companheira. Estar com ela é estar em casa.  Entretanto...

O mais valioso não é o mais importante. A falta da mais vulgar, menos nobre das sensações, inviabiliza todo o resto. Por mais precioso que seja.  Na culinária da vida, o sal vale mais do que a páprica. Assim sendo, toda a elevada ternura de um amor verdadeiro se faz secundária perante a ausência de um elemento chave: O desejo.

Não posso falar pelas outras pessoas, mas não posso viver sem. Tentei, não foi possível. Nunca foi possível. Levando em conta o número de homens nessa tediosa e ansiosa sala de espera, não sou o único. Mas bem poderia ser, não me importa. O que importa  é que preciso ser desejado. Pago qualquer preço.  E esse desejo ao qual me refiro não é o abstrato das páginas de revistas eróticas. Dos corpos mais que perfeitos carregados de sex appeal e retoques fotográficos. É a vontade de viver a aventura da transgressão do sexo, da intimidade física,  na companhia daquela pessoa. Fosse essa uma grandeza estética, John Lennon não teria escolhido Yoko Ono.

Assim, Luzia entrou em cena. Não particularmente atraente fisicamente ou agradável como pessoa. Não despertaria uma segunda olhada não fosse pelo fato que sentia desejo por mim. Deixou explicito em várias ocasiões. Não demorou para que o fogo e a pólvora se encontrassem. Não a amava ou amaria. Sabíamos disso e era recíproco. O importante é que, depois de tanto tempo, eu tinha novamente a excitação em minha vida.

Nada... Nem mesmo o amor verdadeiro... se iguala ao toque do desejo.

Durou pouco e o fim não foi lamentado. Não ter aquela pessoa por perto era quase um alívio. Novamente, recíproco.

É melancólico, pelo menos para uma pessoa como eu, ter de expor a própria saúde para conseguir um mínimo operacional de vida. A sensorialidade básica e  essencial de todo ser humano. Ser desejado.

Agora, estou a alguns momentos de uma consulta médica cujo desfecho pode perfeitamente vir a ser meu epitáfio. Um envelope de laboratório sendo aberto. A frase temida. Mas, ironicamente, seja lá o que o destino reserve para mim nos próximos minutos... terá valido cada segundo!

A morte é natural. A morte em vida, não.

Um comentário:

  1. Parabéns! Uma crônica com todos vários ingredientes das relações desta época.

    ResponderExcluir